“Vivo condenado a fazer o que não quero
Então, bem comportado, às vezes, eu me desespero
Se faço alguma coisa sempre alguém vem me dizer
Que isso ou aquilo não se deve fazer
Restam meus botões...
Já não sei mais o que é certo
E como vou saber
O que eu devo fazer
Que culpa tenho eu
Me diga amigo meu
Será que tudo o que eu gosto
É ilegal, é imoral ou engorda?
Há muito me perdi entre mil filosofias
Virei homem calado e até desconfiado
Procuro andar direito e ter os pés no chão
Mas certas coisas sempre me chamam atenção
Cá com meus botões...
Bolas eu não sou de ferro
Paro pra pensar
Mas não posso mudar
Que culpa tenho eu
Me diga amigo meu
Será que tudo que eu gosto
É ilegal, é imoral ou engorda?[...]”
Roberto Carlos
Olá, Envenenados!
Já repararam como tudo
hoje em dia dá processo ou causa trauma?
Roberto
Carlos tinha lá seus motivos quando compôs Ilegal, Imoral ou Engorda; que
deveriam ser muitos, devido ao contexto histórico em que vivia e às suas
necessidades numa sociedade reprimida, mas ao mesmo tempo hipócrita.
Lamento informar, RC,
mas as coisas só pioraram de lá pra cá.
Sou
de um tempo em que ser criança era saber que, aos domingos, o almoço era na
casa da vovó. E, assim que chegávamos lá, a D. Maria nos dava a bênção e nos
mandava brincar no quintal. Criança não participava das conversas ou discussões
dos adultos. Nem sabíamos que tinham problemas a serem discutidos. A gente não
se metia, não dava opinião e tinha muito tempo para ser criança.
Curioso
é que, por lei, a criança não pode trabalhar, mas não me lembro de ver crianças
vendendo balas ou fazendo malabarismo em sinais no meu tempo de criança. E gente,
eu tenho 44 anos.
Nós
brincávamos com os amigos na rua, sem medo de sermos molestados. Tudo bem, isso
já existia, não vou ser tola e fechar os olhos para isso, pois criminosos
sempre existiram. Mas brincávamos, conversávamos, pintávamos o sete, e muitas
vezes brigávamos também, mas nossos pais nem sabiam, pois o que se ouvia em
casa era: “Não quero saber de brigas, de desrespeito, pois se aparecer em casa
machucado, vai apanhar aqui também.” Quem era besta de chegar dizendo que arrumou
confusão na rua e ainda correr o risco de, depois dos puxões de orelha, ficar
de molho, sem sair novamente?
Na escola
era a mesma coisa. Nossos professores só davam aula, não tinham que nos ensinar
a nos comportarmos dentro de sala. Ninguém queria passar vergonha na frente da
turma inteira, levando um “sabão”. E isso seguia até o Segundo Grau (Ensino
Médio).
Deus
nos livrasse de alcaguetar (que na época ainda era com o saudoso trema) algum
colega. Nossos problemas jamais chegavam aos professores. Lembro-me de um dia
em que um colega de turma escreveu BUCETA no quadro (negro), umas três vezes,
porque alguns de nós apagávamos. Isso poucos minutos antes da professora de português
entrar. O atazanado, que era o meu amor da adolescência – que nunca se
concretizou, pois eu morria de vergonha até de olhar para ele – continuou a
escrever, com letras tipo outdoor,
até que a professora, por fim entrou, sem que desse tempo de apagarmos.
Enfim,
foi tenso! A professora quis saber quem era o autor da obra, mas ninguém sequer
respirava. Como ela ameaçou a turma toda, ele assumiu. Quando questionado do
que se tratava, ele disse que era apenas uma sigla – miserável – e ela quis que
ele explicasse o significado da tal sigla. O povo que estudou OSPB nos anos de
1980 deve se lembrar de uma estrada faraônica, que retrata bem a idiotice do
regime militar, a Estrada Transamazônica. Então, o espertinho disse que era a
sigla de Brasileiros Unidos Constroem Estrada Transamazônica. Resultado,
ninguém conseguiu rir, por “cagaço” da professora, mas nunca mais esquecemos
isso. A professora? Simplesmente disse-lhe que ele havia esquecido de pontuar a
sigla – B.U.C.E.T.A. E acabou-se a história.
Se
fosse hoje, não faltaria que entregasse o cabra, que jamais assumiria o ato.
Convivíamos
com apelidos, zoações, estigmas por conta de uma característica marcante ou
apenas por estudarmos mais que os outros. Mas nem por isso ninguém precisou
fazer tratamento psicológico. Ninguém interrompia a aula para fazer queixa com
o professor.
Hoje
somos reféns de leis que deveriam melhorar a vida das pessoas, mas que são
utilizadas apenas como instrumento de ameaça. Você não pode fazer nada, tem que medir o que fala, caso contrário, pode ser processado.
Sempre
gostei de assistir a desenhos animados, adorava o Pernalonga, Patolino,
Pica-Pau, os Flintstones, entre tantos outros, em que os personagens pintavam e
bordavam, mas nem por isso eu saia por aí fazendo o mesmo que eles. Aprendi desde
cedo que “meu direito começa, quando termina o do outro”. Hoje as crianças
repetem o que seus personagens favoritos fazem, mas não podemos lhes chamar a
atenção, para não traumatizá-las. Não me levem a mal, não, mas aqui em casa os
passos da dança são ditados por mim.
Até
inventaram uma palavra para assombrar nossas vidas. Tudo agora é bullying.
“Bullying é um termo da língua inglesa
(bully = “valentão”) que se refere a todas as formas de atitudes agressivas,
verbais ou físicas, intencionais e repetitivas, que ocorrem sem motivação
evidente e são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia,
com o objetivo de intimidar ou agredir outra pessoa sem ter a possibilidade ou
capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de uma relação desigual de
forças ou poder.
O bullying se divide em duas
categorias: a) bullying direto,
que é a forma mais comum entre os agressores masculinos e b) bullying indireto, sendo essa a
forma mais comum entre mulheres e crianças, tendo como característica o
isolamento social da vítima. Em geral, a vítima teme o(a) agressor(a) em razão
das ameaças ou mesmo a concretização da violência, física ou sexual, ou a perda
dos meios de subsistência.
O bullying é um problema mundial,
podendo ocorrer em praticamente qualquer contexto no qual as pessoas interajam,
tais como escola, faculdade/universidade, família, mas pode ocorrer também no
local de trabalho e entre vizinhos. Há uma tendência de as escolas não
admitirem a ocorrência do bullying
entre seus alunos; ou desconhecem o problema ou se negam a enfrentá-lo.
Esse tipo de agressão geralmente ocorre em áreas onde a presença ou supervisão
de pessoas adultas é mínima ou inexistente. Estão inclusos no bullying os apelidos pejorativos
criados para humilhar os colegas.” http://www.brasilescola.com/sociologia/bullying.htm
Assustador,
né? Mas real.
Como
diz Maurício de Sousa numa campanha nacional: “Bullying é inadmissível.”
Concordo
plenamente, mas antes é preciso identificar o que realmente é bullying e se
realmente está sendo praticado.
Eu
tento entender como uma sociedade que cultua essa prática, agora começa a fazer
campanha contra ela. Sério, é só ligar a TV e passar 3 minutos assistindo à
programação de alguns canais. Programas como Malhação (que já deu o que tinha
que dar – se é que tinha mesmo), Glee, essas novelas latinas, seriados da
Nickelodeon, que valorizam o errado e tornam medíocre o correto.
A Mônica,
por exemplo, sofre “bullying” direto do Cebolinha e Cia. Tudo bem que ela
resolve na base da coelhada e, mesmo assim, eles continuam. Essa personagem tem
mais de 50 anos, e nunca influenciou ninguém negativamente. Por quê?
Por
mais que tenhamos lido suas histórias, o que prevalecia era a orientação, a
educação que recebíamos da família. Lógico, há exceções, mas a maioria de nós
não partia para a briga, quando um ou mais colegas implicavam conosco.
O que
eu ouvia, se tivesse coragem de contar, era: “Não dê importância, não revide,
ignore, uma hora acaba, mas se continuar, vamos tomar providências.” E isso quando
já éramos adolescentes. Hoje os pequenos se enfrentam, enfrentam os adultos e
ninguém sabe o que fazer. Seria bom criarem uma cartilha para ensinar como
lidar com isso. Assim como criaram o Estatuto da Criança e do Adolescente, que
lhes dá carta branca, deveriam criar um Estatuto do Adulto Desnorteado em
Relação aos Menores de Idade.
Ilegal,
Imoral ou Engorda?
Tudo
ao mesmo tempo.
Vou
nessa, tentando me encontrar e dar sentido na prática de tudo que aprendi
quando criança, tentando não ofender nem prejudicar ninguém. Só gostaria que a
recíproca fosse verdadeira.
Fiquem
bem, queridos.
Nossa, eu simplesmente adorei esse post. Esse é um assunto um tanto polêmico, ultimamente. Tu falou, exatamente, o que eu penso.
ResponderExcluirEu tenho 21 anos. Lembro de que as outras crianças riam de um colega, por ele ser gordinho, lembro que as outras crianças riam de outro por ser muito magrinho, riam de mim por causa do meu cabelo (cortado como de menino na época). E nem por isso nenhum de nós brigou com ninguém. Isso acontecia com todos, todo mundo ria de todo mundo. Não tinha essa coisa de bullying. Acredito que isso exista hoje. Mas na época, a gente era bem educado dentro de casa. Ainda hoje, conheço o gordinho e o magrinho. E os dois são ótimas pessoas, ainda gordinho e magrinho, hehe. Mas, tem suas próprias vidas, trabalham, estudam, enfim, vivem suas vidas.
Porém hoje, vejo coisas inacreditáveis. Como a menina que se matou porque sofria bullying na escola. Onde estavam os pais desta menina? Nas fotos do face dela, ninguém sabia de quem ela estava sofrendo bullying. Outros diziam que se descobrissem quem era, iriam picar, bater e etc... Estamos vivendo em uma sociedade hipócrita. Se as crianças fossem bem educadas dentro de casa, aposto que as proporções das coisas terríveis que acontecem na rua seriam bem menores.
Beijos <3
Disse tudo, Roberta!
ExcluirÉ bem por aí mesmo!
Adorei tua visita e conhecer seu ponto de vista!
Beijo
Nossa que Papo Maravilhosoooooooo....
ResponderExcluirTania, concordo com vc em tudo amiga!!
Como professora vejo que a educação NÃO mais é feita em casa e sim delegada a escola mesmo!!! E os pais enchem o peito para dizer que a escola é que é responsável por isso... #medo Fico com medo desta geração quando se tornar adulta.
Beijocas, <3
Sinistro, né, Math?
ExcluirMuitas coisas evoluíram, mas a educação parece que sofreu muito dos essas alterações.
As pessoas não conhecem seus verdadeiros papéis na família, na sociedade, no mundo! Lamentável!
Beijo
Queridíssima!
ResponderExcluirAmei!!!
Engraçado como compartilhamos esses princípios... Engraçado, não! Fomos educadas numa realidade em que as instituições: Família, Escola, Igreja (independente da fé) e Estado funcionavam, nos formavam, nos protegiam.
Lembro-me quando meu vizinho pegou e rasgou minha bola em plena brincadeira com os amigos do prédio porque estávamos brincando no pátio. Esse gesto me ensinou que as regras foram fitas para serem cumpridas, que devemos cuidar do espaço de todos, que a liberdade tem seus limites e que a democracia não quer dizer faça tudo o que quiser. Sou grata ao meu vizinho e sempre multiplico essa lição. Beijão e parabéns pelo texto! :)
Lembro desse episódio, amiga!
ExcluirHá coisas que, de fato, nos marcam para sempre.
Ninguém saiu traumatizado, mas usamos as situações pelas quais passamos para construir nosso caráter. Somos frutos das lições que tivemos.
Que possamos passá-las aos nossos filhos, sobrinhos e quem mais necessitar!
Amei sua presença por aqui!
Beijão!